quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Olelê quilelê tilelê ô...


Quando eu ainda estava no T.U (Curso técnico de Teatro aqui em BH, pra quem não sabe) começou a utilizar-se a denominação “tilelê” para as pessoas que tocam tambor. Até aí tudo bem. Eu participo do movimento dos tambores desde quando eu tinha 15 anos (quem me dera ter nascido nesse meio) e sempre participei ativamente. Durante a adolescência adorava as saias longas, as sandálias rasteirinhas, flores no cabelo, os dreads, as tranças e afins. Claro que até hoje ainda gosto e uso, mas é porque quando a gente é adolescente – e bobo - a vestimenta representa aquilo que pensamos, assim como o tipo de música que se escuta. E eu, sempre fã de música brasileira, estudante de percussão, logo me encaixei na denominação tilelê.

O Movimento dos Tambores Mineiros possui em sua maioria a população negra de Minas Gerais que encontra nos tambores uma forma de se expressar, de cultuar suas origens, de manifestar sua cultura e de se assumir como negro, ganhando força em suas músicas, atitudes, cabelos, peles. Eu, como negra que sou, sempre me inteirei dos assuntos da comunidade negra desde que ingressei no Movimento. Aqui faço uma ressalva a quem questionar minha raça/pele: De acordo com o IBGE, o grupo de pessoas negras abriga dois outros grupos, o das pessoas de pele parda e o das pessoas de pele preta, pois para o IBGE não há a classificação “negro”, com isso todos nós, pardos, somos inseridos no grupo de pessoas negras, racial e socialmente falando pois, a situação dos “pardos” no Brasil é bem parecida com a dos “pretos” quando se fala sobre pobreza, qualidade de vida, condições de moradia e etc. Eu demorei muito pra aprender isso pois minha vida se assemelhava muito com a vida dos “pretos”, mas eu não podia me chamar de “preta” por causa da minha pele clara, daí veio o IBGE e a UFMG me ensinar isso que eu exponho pra vocês agora, que de acordo com minha pele e condição social, eu sou NEGRA sim. Mas nem por isso eu preciso utilizar das cotas raciais para quem tem a pele “preta” pois ela também se aplica à mim quanto “parda” e quando prestei vestibular, não me beneficiei do bônus social/racial. Mas esse é tema pra outro texto.

Retomando, com o tempo o movimento “tilelê” ganhou outros integrantes. Dos hippies da década de setenta (que hoje tem seus 50/60 anos) aos hippies que vendem artesanato na Praça do Sete, os “micróbios” (pra quem não sabe, micróbio não é uma denominação ofensiva, é um nome utilizado pelos próprios artesãos do Praça Sete sobre um tipo de hippie), pessoas ricas que curtem o estilo, atores, músicos e etc. O palavra “tilelê” vem de uma música do Tizumba, um dos cabeças do Movimento dos Tambores em Minas.

Depois de um tempo percebi que as pessoas de fora do movimento utilizavam a palavra “tilelê” de forma pejorativa. Quem estava de fora via apenas um “monte de gente suja, mal vestida, barulhenta a maconheira”. Isso foi um grande problema, agora a palavra tilelê era sinônimo de usuários de drogas. Lá se foi um nome bacana... Que eu sou contra drogas todo mundo sabe (e quem não sabia, sabe agora), além disso, acho um absurdo uma pessoa de dentro do movimento compactuar com isso, ser usuário, sabendo do grande número de negros que morrem para que as drogas cheguem nas mãos de outros negros, afinal, sem usuários não precisaríamos dos traficantes, nem dos aviõezinhos, nem dos olheiros, nem dos fogueteiros nem de tanta gente negra trabalhando com drogas. Mas isso é uma questão social, mas isso é um assunto educacional, mas isso é um tema que todos sempre vão buscar desculpas pra se safar...

Portanto, o nome tilelê envolve uma série de questões que analisamos melhor quando pensamos sobre o assunto. Hoje não me enquadro mais na denominação tilelê e não concordo que todos os participantes do Movimento dos Tambores também o sejam. Ser tilelê é ser negro? É tocar tambor? É ser rico? É fingir-se de negro? É usar drogas? Pela falta de identificação com tudo isso e a relação de todas as coisas juntas é difícil encontrar uma definição. Entre alguns músicos mineiros são comum as brincadeiras sobre a forma que o tilelê se veste, a forma que dançam, o uso constante de drogas e dessa forma, acaba que estamos brincando com nós mesmos, com o que fomos, com o que somos e com o que pertencemos. Hoje desassocio o fato de usar drogas com o Movimento, pois isso seria dizer que todo negro é maconheiro e com isso eu estaria sendo enquadrada também, afinal, se vamos falar de estereótipos, eu sou atriz, musicista, produtora e pobre, com certeza muita gente também em acha maconheira!

Escrevi, escrevi e não cheguei a nenhuma solução. Acredito que nem vou chegar. Essa é mais uma denominação e estilo que vai se desvirtuando, assim como foram os punks, assim como foram os hippies e afins. Mas escrevo para mim mesma e depois para os outros, como uma análise e, nessa análise sobre tilelês, percebo que continuaremos nos manifestando em grupos pequenos, alguns grupos defenderão a nomenclatura como palavra escolhida para dizer dos integrantes do Movimento, outros sempre acharão graça da forma como eles dançam, outros pensarão que tilelê é sinônimo de negritude. Chegaremos a um consenso? Não. Mas agora que descobri que as pessoas têm visão diferente daquela do grupo que eu participo, fiquei interessada nos pontos de vista que cada um tem sobre tilelê, que pode ir de uma expressão carinhosa à uma generalização preconceituosa.

OBS: Nesse texto não me aprofundei na luta pelo orgulho negro, no Congado Mineiro, na minha posição anti-drogas e nas epsquisas do IBGE porque tudo isso daria mais vários textos.

Um comentário:

  1. Você está chamando os maconheiros de forma pejorativa, assim como acham que tilelês são chamados de forma pejorativa. Maconheiro não é marginal. nem todo maconheiro contriubui para o tráfico. Maconha não mata, mas sim a guerra as drogas e a situação social gerada pela proibição.

    ResponderExcluir