quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Um conto da noite...



O dia não passara tranquilo como sempre. A inquietação do breve encontro inquietava sua alma e causava-lhe frio no estômago. Pela primeira vez, depois de tantos anos, seus desejos se direcionavam a outro e no momento não havia nada mais excitante e amedrontador do que aquilo.
Encontrou tempo para pensar em si durante o almoço e decidiu: calcinhas novas. Sim! Era preciso comprar calcinhas novas para marcar aquele momento. Esse seria o primeiro passo. O próximo passo talvez fosse fazer uma tatuagem, mas nisso ela pensaria depois.
Em casa, o banho demorado refletia a insegurança e o medo do novo. Era como se apenas ali, debaixo d'água, ela estivesse segura de seus atos. Mas foi pela insegurança que ela abdicou de sua vida anterior e agora era preciso assumir os riscos.
Cremes, cabelos molhados, óleos perfumados, depilações feitas, roupa escolhida, era hora de se aprontar pra si mesma. Afinal, aquele não era um encontro com um outro alguém. Era um encontro consigo. Ela resolvera levar-se pra passear e pra isso, era preciso enfeitar-se.
NO espelho os cílios ganhavam volume. As bochechas se coravam e os dentes eram constantemente conferidos. Era preciso causar boa impressão. Ela precisava de respostas imediatas!
Bolsa completa, era a hora do adereço final: dentro da gaveta, camisinhas guardadas de tempos antigos agora ocupavam lugar de destaque na bolsa. Seriam suas companheiras das noites e dias de solidão acompanhada. Solidão que ela buscara sem saber.
A hora marcada se aproximava. ela já sabia o que a esperava naquela noite que mal havia começado. Sentiu o medo correr pela pele como uma criança que descobre o sexo oposto. Sacudiu os cabelos e fez-se parecer mulher decidida. Por dentro, havia uma menina assustada e curiosa.
Pensou em frases feitas, movimentos possíveis, imagens da noite que ainda não começara e decidiu entregar-se à pequena barrinha de chocolate, amiga e toda mulher. Decidiu também entregar-se á vida. Isso ela já havia decidido há tempos, só não havia assumido pra si própria.
Ouviu o telefone.Sabia que era chegada a hora. Não havia como voltar atrás. E ela nem queria isso. O chocolate deu-lhe coragem. Em frente ao espelho, conferiu o batom vermelho que outrora só usava para agradar a alguém específico. Decidiu que seria essa a cor da sua vida. Pensou em um pseudônimo, mas logo abandonou a idéia por parecer dramático demais.
Fechou a porta de casa, fez um sinal da cruz e saiu portão á fora exuberante de pernas e alma expostas. Sentia-se errada, suja e estranha, asma quele misto de sensações não era nada menos do que delicioso.
Naquela noite, naquela esquina, entrou no carro alheio e decidiu que começaria ali sua outra vida. Uma outra vida talvez, mais vermelha...

Um comentário:

  1. Adoro vermelho.
    Acredito que o auto-conhecimento acontece mais facil(doce)mente quando se é livre.
    Adorei o conto!
    Bjim

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